Arquitetura prisional e a ciência social aplicada: A arquitetura da Papuda e as duas grandes fugas de fevereiro de 2016

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papuda

 

Em 21 de fevereiro de 2016 aconteceu a segunda fuga em menos de vinte dias em um dos complexos penitenciários considerados “de mais alto padrão de segurança” do país, sobretudo no que tange ao modelo arquitetônico adotado, a Fazenda Papuda, em Brasília. Evidentemente, para quem não conhece o local, é necessário contextualizar um pouco melhor, que traz estabelecimentos penais que podem ser considerados universos à parte entre si: os dois módulos do Presídio do Distrito Federal (PDF1 e PDF 2), a Penitenciária Feminina, o Centro de Detenção Provisória (CDP) e o Centro de Internação e Reeducação (CIR). No total, a população carcerária chega a quase 14 mil.

Nesta segunda fuga, ocorrida no PDF 1, em que diversas barreiras arquitetônicas foram propositadamentes concebidas desde o momento projetual para que coibissem evasões por parte dos detentos, como, por exemplo, armações no concreto feitas em duas direções, muros com seis metros de altura entre os pátios de sol, guaritas de vigilância, pilares triangulares para dificultar a escalada e, por fim, muros com vinte metros de altura nos perímetros externos.

Se toda essa cautela não bastasse, a tecnologia ainda foi aliada para que a segurança não falhasse. Câmeras de vigilância e circuito interno foram instaladas em posições estratégicas, para auxiliar os agentes penitenciários. Além disso, os detentos passam por uma rotina diária, no intuito de serem redisciplinados a viverem sob um rígido programa habitual, de mesmas atividades, de modo a facilitar o comando dos poucos agentes penitenciários que lutam para manter a ordem.

O até então secretário de Justiça e Cidadania do Distrito Federal, João Carlos Souto, afirmou que todos os fugitivos ocupavam uma mesma cela no pavilhão F e que eles teriam quebrado a parede do quarto e acessado um corredor, onde teriam quebrado um cadeado e seguido até o pátio central do presídio. Ao longo do caminho, o grupo teria tapado todas as câmeras de segurança.

Já no pátio, os dez presos teriam pulado o muro com objetos fabricados para a fuga, como uma corda artesanal. João Carlos Souto diz que havia agentes penitenciários na unidade quando os presos escaparam, mas a fuga não teria sido identificada imediatamente, mas somente horas depois, no momento da chamada nominal.

 

fugitivos

 

 

Porém, logo se vê que não só de aparatos tecnológicos e arquitetônicos se resolve o sistema penitenciário. Trata-se de um problema social/sociológico muito mais complexo do que se quer admitir. E enquanto não se discute, o que se tenta fazer é empurrar a culpa de um para o outro. Ao invés de se tentar achar alguma solução, o que se parece tentar fazer é escapar do problema, e, com isso, a situação só tende a se agravar. Segundo informações da Secretaria de Justiça, o Distrito Federal tem 7,1 mil detentos a mais do que a capacidade das prisões, sendo 7.411 vagas para 14.517 presos.

Logo se colocou na equação a briga das categorias dos agentes penitenciários, que supostamente não queriam exercer as suas funções, tendo que ter o seu retorno às atividades ser  determinado por decisão judicial, e da polícia civil, que estaria fazendo corpo mole para recapturar os fugitivos. Além disso, pode-se verificar que muitos adicionam versões sobre situações totalmente alheias ao problema de fato somente para piorar o caos.

Resultado: em poucos dias, a cúpula foi exonerada pelo governador, e, poucas horas depois, o segundo escalão da Justiça acabou pedindo para sair em solidariedade ao secretário demitido.

Com esse tipo de ocorrido, torna-se mais do que evidente que não basta focar tão somente em uma arquitetura perfeita, capaz de solucionar todos os problemas imagináveis em um contexto prisional. É necessário saber reconhecer que a ciência, no caso, a ser aplicada tem um espectro muito mais amplo e que ele não só pode, mas deve sim ser explorado de maneira responsável para que possa ser feita de maneira bem sucedida.

 

 

 

Confira a lista de foragidos

–  Marcos Antônio Moreira dos Santos: a ficha criminal é extensa e inclui pelo menos 10 ocorrências de roubo e receptação, sendo oito relacionadas ao roubo de veículos. Vulgo “Marquinhos”, cumpre pena total de 93 anos em regime fechado.

– Michael da Mata Silva: foi condenado por homicídio e roubo, com pena somada de 63 anos e 2 meses em regime fechado.

– Gerson Inácio Ferreira: foi condenado por homicídio e ocultação de cadáver, com pena somada em 29 anos.

 

Veja a lista de recapturados:

– Gedeone Montalvão Bento: quatro passagens por homicídio, uma por roubo e outra por associação para o crime. Vulgo “Nego Geo”, ou “Roupinol com Fel”, foi condenado a 35 anos e cumpre pena em regime fechado.

– Laiuço de Brito Santos: foi condenado por três homicídios e dois roubos. Vulgo “Bolacha”, cumpre pena de 75 anos e 11 meses em regime fechado.

– Jefferson Alves Faria Carvalho: condenado por dois homicídios, cumpria pena de 8 anos e 6 meses no regime semiaberto. Vulgo “Maluquinho”.

– Valdeir Alves de Brito: condenado por roubo, receptação, tráfico de drogas e homicídio. Vulgo “Duduca”, foi condenado a 70 anos e 10 meses e cumpre pena em regime fechado.

– Cleiton da Silva Liberato: a ficha criminal inclui duas passagens por tráfico de drogas e duas por homicídio. Vulgo “Jabá”, cumpria pena de 9 anos e 4 meses no regime semiaberto.

– Francisco Elton de Lima Sousa: vulgo “Baianinho”, tem duas acusações por homicídio. A ficha não tem informações sobre a pena total.

 

  • Levino Pereira de Brito, 37 anos, um dos foragidos, condenado a 93 anos de prisão que estava preso desde 2012, foi morto em uma troca de tiros com a polícia na madrugada do domingo, 28/02/2016, em Brazlândia após reagir a uma abordagem da Polícia Militar por volta das 2h.

 

(Atualizado em 28/02/2016)

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