Recentemente, lendo a timeline do meu twitter, li a seguinte informação:
“Há um déficit de 197.872 vagas. São necessários 396 estabelecimentos penais, com capacidade para 500 presos cada um, para acomodar todos.” (Por Cecília Olliveira – @Cecillia – em 2 de fevereiro de 2011)
Tal publicação de dados me fez refletir sobre o que tem sido divulgado sobre a situação carcerária no país e sobre os seus respectivos efeitos. Evidentemente, a situação é bastante alarmante e a análise quantitativa parece ser suficientemente precisa. No entanto, é exatamente aí que residem os mal-entendidos por parte do governo e da sociedade em geral.
O sistema penitenciário é algo de uma complexidade sem igual, sendo por natureza um tema bastante interdisciplinar que envolve uma série de variáveis. Os dados numéricos devem ser analisados também qualitativamente, sendo que os resultados não são necessariamente fáceis de ser alcançados. Assim, não se pode simplesmente assumir que a construção de 396 estabelecimentos penais com capacidade para 500 presos possa resolver o problema. Ao contrário, outras questões devem ser levantadas. Por exemplo, o número de vagas necessárias envolve que tipo de presos? Seriam presos provisórios ou condenados? Quais os crimes cometidos? Qual a duração da pena? Qual o contexto social da pessoa presa?
À primeira vista, tais perguntas parecem não fazer conexão com o número de estabelecimentos penais a serem construídos. Porém, deveriam ser considerados fatores decisivos para a tomada de decisões políticas relacionadas a como e quando construi, ampliar e/ou reformar tais estabelecimentos. Principalmente porque a própria legislação prevê a individualização da pena e a separação de presos, de acordo com avaliações objetivas e subjetivas. Assim, presos provisórios devem ser acomodados em estabelecimento próprio, separado daqueles destinados a presos condenados. E as penas aplicadas por meio da condenação devem ser executadas segundo o regime estipulado (fechado, semi-aberto ou aberto), respeitando a sua progressão. E, para cada regime, existe um tipo específico de estabelecimento penal.
Além dos detalhes mencionados acima, deve-se observar que cada estabelecimento penal segue um programa de necessidades específico para alcançar os seus objetivos. Para tanto, carregam peculiaridades quanto aos espaços projetados, materiais utilizados na construção, nível de segurança, as interações sociais que devem ser encorajadas (ou evitadas), entre outros aspectos.
Porém, a falta de enfoque nesses detalhes fundamentais faz com que o sistema penitenciário brasleiro seja um verdadeiro caos. Não se trata de falta de recursos para a construção, ampliação e/ou reforma de estabelecimentos penais. Ao contrário, o Fundo Penitenciário Nacional, FUNPEN, administrado pelo Departamento Penitenciário Nacional, DEPEN, possui orçamento anual invejável, se comparado a outros setores públicos. Mas a falta de manipulação dos dados estatísicos de maneira mais cautelosa faz com que haja a perpetuação de velhas soluções, aplicadas de maneira equivocada. Uma delas é a construção indistinta de edificações penais com altos padrões de segurança (o que definitivamente encarece a obra de maneira substancial) sem que haja necessidade. Ou ainda, a multiplicação da ideia de que a prisão é “faculdade do crime”, simplesmente pelo fato de não haver a devida separação de presos. Sem contar com a infinidade de problemas de saúde causados pela falta de ventilação ou iluminação apropriada, como a tuberculose, a sarna, entre outros.
Assim, pode-se perceber que o problema não é tão simples de ser resolvido e que depende de muito mais atenção do que se tem dado.
Post escrito na vigência da Bolsa de Estágio de Doutorado – Balcão concedido pela CAPES, desenvolvido na Pennsylvania State University, em State College, PA, Estados Unidos.