Melhorando a arquitetura das prisões: um novo olhar sobre o propósito de suas funções

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Na Europa, está acontecendo um movimento de se fechar prisões, como forma de oportunidade de redesenvolvimento urbano, bem como de se construir novas prisões em escala mais humana, com iluminação natural e instalações melhores e mais adequadas. Mas isso poderia dar uma luz para uma próxima geração e se tornar uma norma no futuro? Quem sabe?

O arquétipo das prisões do imaginário coletivo é algo sombrio, com paredes de concreto, muralhas e portões de altíssima segurança, isolados dos olhos da sociedade. Porém, na atualidade, essas prisões clássicas se encontram imersos no perímetro urbano e não se pode ignorar tal fato. Assim, muitas dessas instituições já tiveram seus destinos decretados: serão fechadas e reconstruídas, na maior parte delas na forma de “conjuntos habitacionais”, fora de áreas urbanas.

 

 

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Ny Anstalt, Groelândia

 

 

A decisão de se trocar as antigas prisões, em sua arquitetura Vitoriana, por algo mais inovador, para o Chancelor George Osborne, ocorreu após o secretário de justiça Michael Gove apontar para o excesso de “bullying, tráfico e violência” que ocorriam dentro desses estabelecimentos “sem eficiência e antigos”. Assim, a ideia de Gove trazida pelo relatório Prisões do Futuro, que propunha uma “central” de prisões com arquitetura de ponta, abrigando 3.000 detentos cada, em estilo de acampamento, com serviços centralizados.

Certamente que a arquitetura da prisão Vitoriana traz em comum o seu aspecto punitivo excessivo. Traz referências a castelos e calabouços, com as muralhas e torres em pedras. Sua principal característica – celas organizadas em galerias em torno de um átrio central – realmente cumprem o seu papel. “Fazem um excelente tranalho para boa visibilidade e para proporcionar uma boa segurança”, afirma Juliet Lyon, da Prison Reform Trust. Mas esse modelo arquitetônico é demasiadamente punitivo e não é eficiente quando se tenta o equilíbrio dos pilares “redenção e reabilitação”. “Trata-se de um verdadeiro pesadelo entre saúde e segurança, quando pessoas precisam dividir o espaço, dentro da mesma cela, de permanência e o vaso sanitário. Eles acumulam ressentimento”. Paredes de concreto frias e portas de ferro barulhentas que se fecham induzindo altos níveis de estress não ajudam! Ao contrário, só aumentam o drama!

 

 

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Plantas da Prisão de Ooiioo, Islândia

 

 

Historicamente, o Reino Unido foi precursor nos modelos arquitetônicos de prisões, tendo dado ao mundo um dos primeiros designs mais famosos, o Panóptico, criado pelo teórico Jeremy Bentham no final do século XVIII e que ficou famoso e foi multiplicado pelos seguidores do filósofo francês Michel Foucault. Tal modelo permitia que um número reduzido de guardas pudesse vigiar os presos de um ponto centralizado, cortando os custos e supostamente fazer com que eles se auto-restringissem de suas más ações, agindo diferente, tendo o conhecimento de que estavam sob vigilância constante. Na era tecnológica, tal conceito foi substituído pelo circuito interno de televisão.

Mas recentemente, Yvonne Jewkes, professor de criminologia da Universidade de Leicester, afirmou que, apesar de todos os esforços no sentido de humanizar os edifícios prisionais, trazendo “arquitetura de ponta” e eliminando os “armazéns de pessoas”, balanceando-se a segurança, criatividade e a humanidade nos sistemas correcionais, as prisões e a sua construção não possuem nenhum engajamento com o seu “cliente”, ou “usuário final”. Não é como qualquer outro projeto arquitetônico, em que se busca saber das suas necessidades, das suas preocupações, dos seus anseios. Ao contrário, tudo isso é ignorado. Nessas 9 novas prisões que se vão construir, provavelmente o que vai se conseguir será uma “arquitetura da esperança”. Mas ela não é otimista quanto aos resultados e nem Will Alsop, da aLL Design. Dez anos atrás, Alsop desenvolveu um projeto junto com a Rideout (Creative Arts for Rehabilitation), uma organização que promove arte dentro do sistema penal, e descobriu um detalhe de cortar o coração: camas de apenas 1.80m de comprimento, lavatórios dentro das celas a apenas 60cm de distância da cama. “Eles simplesmente enfiam os presos dentro desses lugares infames”, ele diz. “Não é de se espantar que são universidades do crime”. Alsop recomendava dar mais autonomia aos presos: as chaves das celas, trabalho significativo, melhor educação, grupos com faixa etária diversificada – até mesmo permitir que presos pintem a sua própria cela de modo que eles atinjam um “senso de lugar”. Alsop diz ainda que “escolas deveriam fazer pessoas aprenderem; hospitais deveriam fazer pessoas se sentirem melhores; prisões, portanto, deveriam promover a reforma”.

“Contratos de desenvolvimento de projetos arquitetônicos e construção de estabelecimentos prisionais são distribuídos para uma série de firmas anônimas ao redor do mundo e, isso é um processo que discoraja a inovação”, diz Jewkes.

Lyon diz que houve diferentes estágios na arquitetura prisional, e os estabelecimentos contruídos entre 1960 e 1980 focaram em reabilitação, criando espaços que se podem chamar de “salas comunais”. Mas estas não necessariamente evoluíram de forma positiva, uma vez que muitas possuem tetos baixos, pontos cegos, corredores. Durante motins, pessoas acabavam presas e, por isso, alguns materiais, como piso de vinil, isolamento térmico e aquecimento sob piso não são mais utilizados caso a segurança seja comprometida.

Karin Beijersbergen, da Netherlands Institute for the Study of Crime and Law Enforcement, estabeleceu a existência de seis estilos de modelos arquitetônicos amplos, entre os séculos XIX e XXI: panóptico, radial, retângular, pátio, vertical, acampamento, mais ou menos nessa ordem histórica. No seu estudo, ela argumentou que quanto mais aberto, assim como Lyon, melhor é o relacionamento com entre staff e os detentos e isso faz com que a probabilidade de reincidência seja reduzida. “A abertura dos espaços melhora a qualidade das relações e dá suporte à cultura do progresso em detrimento ao do medo”. A proximidade à família é outro fator que auxilia, o que também configura uma preocupação bastante grande quando se pensa em levar as prisões para longe das cidades e, consequentemente, faz com que o tempo de viagem para as visitas se torne muito maior.

“Arquitetura prisional é algo bastante delicado é traz uma série de emoções”, diz Hillary Cottam, uma empresária social, que tem trabalhado com um projeto chamado Learning Prison. “Pessoas que desenvolvem projetos arquitetônicos de prisões deveriam olhar o propósito delas e pensar que elas são lugares em que se ‘acumulam’ pessoas é simplesmente errado”.

Então, onde ficam as boas prisões? Existem algumas que podem ser celebradas ao redor do mundo, incluindo a prisão Bastøy, na Noruega, nas ilhas Bastøy, em que há chalés que se parecem com lugares que você poderia escolher para passar férias, e detentos podem andar a cavalo, pescar e esquiar. Não são destinados para aqueles de “primeira categoria”, mas, mesmo assim, as taxas de reincidência são abaixo de 16%, o que traz bastante interesse de pesquisadores e outros governos.

A prisão Leoben, de Josef Hohensinn, perto de Graz, construída em 2004, na Áustria, tem segurança máxima pelo lado de fora, e segurança mínima pelo lado de dentro, onde os detentos podem usar as próprias roupas, em um forma de tentar que se sintam mais à vontade.

 

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Ilhas Bastoy, Noruega

 

Juliet Lyon não está convencida, porém, que esses exemplos bastarão para influenciar no futuro das 9 novas prisões advindas do que ela chama de “crise das prisões”. O clima da redenção e reabilitação ainda não está ali, segundo ela. “Deve-se, conjuntamente, diminuir o número de presos, diminuir as sentenças e melhorar o desenho arquitetônico”. Jawkes lista, ainda, fatores que ela acredita que arquitetos deveriam integrar: entradas mais receptivas, atmosferas mais socializáveis (com centros comerciais ou centros esportivos), liberdade de movimento e mobiliário móvel, macio e confortável, ao invés de fixo, duro e imutável – sem contar os acessos aos pátios, jardins e a tecnologia.

Prisões podem mudar – assim como pessoas!

 

 

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